17 outubro, 2006

Gigi, Natacha Atlas e Brenda Fassie - World Pop Divas


Três espantosas cantoras. Duas africanas (Gigi Shibabaw - na foto - e Brenda Fassie), outra belga com raízes na África muçulmana, o Egipto (Natacha Atlas), e em Inglaterra. Uma que faleceu em 2004 (Brenda Fassie), as outras duas vivas e em actividade constante (Natacha Atlas, relembre-se, vem ao Porto para um concerto no dia 8 de Novembro). As três com carreiras riquíssimas na procura dos melhores cruzamentos entre as músicas tradicionais e a modernidade. Todas neste lote de discos imprescindíveis.


GIGI
«GOLD & WAX»
Palm Pictures

Primeiro, a relativa má notícia: «Gold & Wax» não é tão bom quanto o álbum do projecto Abyssinia Infinite, «Zion Roots», que Gigi (aka Ejigayehu Shibabaw) protagonizava ao lado de Bill Laswell. Não tem a mesma capacidade encantatória nem o mesmo espaço para o silêncio, a abstracção e a hipnose que esse álbum. Mas também é difícil, muito difícil, que algum disco o tenha depois do patamar de excelência que «Zion Roots» atingiu. Agora, as boas notícias: «Gold & Wax» é igualmente produzido por Bill Laswell e a mistura de rock, dub, algum jazz e electrónicas (aqui bastante presentes) com a música etíope, a música árabe, a música sefardita ou a música indiana, que Gigi e Laswell aqui mostram - repete-se, embora não estando ao nível de «Zion Roots» ou sequer do álbum anterior «Gigi» - é suficientemente excitante para fazer deste um dos melhores discos «world» deste ano. Além disso, Gigi continua a ter uma voz maravilhosa, que voa como uma ave-do-paraíso em temas como «Jerusalem», «Salam», «Utopia» (o único cantado em inglês), «Gomelayeye», «Hulu-Dane» ou o lindíssimo «Acha». Depois, o lote de músicos neste álbum é luxuoso: para além de Bill Laswell estão aqui Nils Petter Molvaer, Foday Musa Suso, Karsh Kale, Bernie Worrell e Ustad Sultan Khan, entre muitos outros. Gigi, etíope sediada nos Estados Unidos, é neste momento, provavelmente, o melhor exemplo de que é possível casar o antigo e o actual, o tradicional e as novas tecnologias, uma alma enraizada no mais profundo da Terra e umas antenas bem atentas a tudo à volta. (8/10)


NATACHA ATLAS
«MISH MAOUL»
Mantra Recordings

Em sentido contrário a «Gold & Wax», de Gigi, está «Mish Maoul», o novo álbum de Natacha Atlas. Não na qualidade musical, que é elevadíssima, mas porque Natacha Atlas está neste álbum num registo muito mais acústico do que é normal nela (tanto a solo como nos tempos em que fazia parte dos Transglobal Underground - e isto apesar de em «Mish Maoul» o dedo da sua antiga banda continuar presente através dos ex-companheiros Count Dubulah e Neil Sparkes, que produziram alguns temas). No novo álbum ainda há electrónicas e programações, sim, mas há um muito, muitíssimo maior, peso de instrumentos acústicos a envolver a sua voz, ainda e sempre uma voz fabulosa em maleabilidade e em riqueza tímbrica. Neste álbum ouvem-se, essencialmente, guitarras acústicas, piano, acordeão, alaúde, percussões árabes, ney, kanun... Mas o mais interessante é que, apesar de os instrumentos acústicos estarem em maioria, a linguagem musical de Natacha Atlas continua lançada para um futuro-mais-que-perfeito em que todas as músicas terão lugar. A música árabe está lá, sempre e bastante presente, a servir de cimento a tudo o resto, mas há muitas outras músicas lançadas para a betoneira: o hip-hop (no fantástico «Feen» e na voz do rapper libanês Clotaire K, em «La Lil Khouf», que também conta com a colaboração da cantora argelina Sofiane Saidi), o gnawa e a música tuaregue (em «Hayati Inta»), a bossa-nova (em «Ghanwah Bossanova» - o título não engana - e em «Bab El Janna», que termina... em português), uma pop fresquíssima (em «Bathaddak», com Princess Julianna num flow irresistível) ou o experimentalismo praticamente inclassificável de «Haram Aylek». «Mish Maoul» é outro muito bom exemplo de que há mundos (musicais e outros) que, em vez de colidir, podem coabitar e mesclar-se em perfeita harmonia. (8/10)


BRENDA FASSIE
«GREATEST HITS»
EMI

Se se não conhecer Brenda Fassie, basta ouvir o primeiro tema desta colectânea, o hit pan-africano «Vul'indlela», para se ficar fascinado com a voz e a música da cantora sul-africana: uma mistura brilhante de qualquer coisa parecida com o euro-disco com a música zulu, coroada com uma voz aberta, luminosa, belíssima. E o resto das canções presentes em «Greatest Hits» (com o sub-título «The Queen of African Pop - 1964-2004», sendo o ano de 1964 o do seu nascimento e não o de início de carreira) é a continuação, lógica, da descoberta de uma personagem incontornável da música africana e da fusão de elementos locais com inúmeras linguagens exteriores: a soul, o funk, o rock, o disco-sound, o tecno, o acid-jazz... Brenda Fassie - falecida em 2004, com apenas quarenta anos - foi uma heroína da música sul-africana. Diva pop, com um sucesso de vendas enorme - a revista «Time» chamou-lhe «A Madonna dos Guetos de Joanesburgo» (nascida na Cidade do Cabo, Brenda mudou-se para Joanesburgo na adolescência) - e com uma vida recheada de pormenores trágicos - depressões, tentativas de suicídio, dependência da cocaína... -, isso não a impediu de se ligar a inúmeras causas sociais e políticas (o Partido do Congresso Nacional Africano, de Nelson Mandela, usou «Vul'indlela» como hino nas eleições de 1999) e de lançar as bases de muita da modernidade da música sul-africana, tendo sido uma das pioneiras do kwaito (um riquíssimo género híbrido de que falarei proximamente neste blog). O «Greatest Hits» de Brenda Fassie é outro bom exemplo de como o tradicional (que está aqui bem presente em alguns temas, como em «Sum'bulala» ou nas maravilhosas polifonias vocais de «Black President» e de outros temas) pode andar de mãos dadas com outras músicas para, assim, criar novos e brilhantes sons. (7/10)

2 comentários:

ANNA-LYS disse...

Hello Antonio
Thank you dear :-) As you maybe have noticed on my blog profile ... Surrealism and PsychNology are my favourite interests. My choice of Margrittes "False Mirror" is in relation to what I think is "false thoughts" when categorizing people into either extrovert or introvert. Humans are complexed and situated, I think.

I will be back on this matter ;-))

I have also tried to find Final Fantasy as you earlier recommended but I failed :-(

*hug*

ANNA-LYS disse...

Thank YOU for the links :-D

Do You like the South-Swedish music on my blog today?