07 fevereiro, 2011

Colectânea de Textos no jornal "i" - XXII


Promessas, apostas e certezas de 2010
Publicado em 07 de Janeiro de 2010

Os críticos e jornalistas de música deveriam ter desistido de fazer apostas para o que de importante virá a seguir ("the next big thing", em inglês) desde que Jon Landau - célebre jornalista norte-americano - viu "o futuro do rock'n'roll e o futuro chama-se... Bruce Springsteen". Não que Landau estivesse errado, longe disso!, mas porque foi o único que acertou (totalista entre milhões de apostadores) numa infindável roda da sorte que só raras vezes, demasiado raras, acerta na mosca. Mesmo assim, arriscamos: o futuro próximo, imediato, urgente, da música portuguesa passa pelos blues renovados dos Nobody's Bizness (primeiro álbum de estúdio quase a sair); pela música tradicional portuguesa moída nos crivos das electrónicas dos Charanga; pela pop inteligente e livre dos peixe:avião; por um novo grupo de Castelo Branco, Ninho, que secretamente reinventa a tradição; pelos açorianos Bandarra (na foto), que, assombrados por alguns cantores de Abril, ainda acreditam numa música de intervenção (nas palavras e na própria música em si); pelos Anaquim, de Coimbra, que fazem a ponte, de modo particularmente inteligente, entre Sérgio Godinho, os Virgem Suta e um eventual e utópico indie rock islando-canadiano; e pelos Orelha Negra, veteranos da cena fusionista lisboeta (Cool Hipnoise e suas margens), com canções que são clássicos instantâneos da soul, do funk e do disco. Certezas absolutas: os novos álbuns do fadista Ricardo Ribeiro e dos revolucionários - cada uns à sua maneira - Deolinda e Gaiteiros de Lisboa (*).




3 pistas... mas muitos caminhos
Publicado em 14 de Janeiro de 2010

Henrique Amaro, há muitos anos o maior divulgador radiofónico de música portuguesa - e também responsável por várias colectâneas de música nacional (e brasileira), pelos "unpluggeds" da Antena 3, por álbuns de homenagem (nomeadamente, a Adriano Correia de Oliveira) e pela direcção artística da editora Optimus Discos - reincidiu agora numa outra excelente ideia: o segundo volume do "3 Pistas". É simples: cada banda ou artista dispõe apenas de três canais de gravação (podem usar três microfones ou um microfone e duas vias para instrumentos, por exemplo), e cada um deles interpreta um tema seu e uma versão. E o resultado deste segundo volume, tal como do primeiro, é um desfilar infindável de boas surpresas: do consagrado Sérgio Godinho a interpretar "Heat de Verão" (com letra dele, mas oferecida originalmente ao Gomo) aos d3ö a desconstruírem "Rehab", de Amy Winehouse, ou aos Noiserv a fazerem uma excelente versão de "Where Is My Mind", dos Pixies. Mas o mais curioso deste segundo "3 Pistas" é que a maior parte das versões são de temas de artistas e bandas portuguesas: os Linda Martini (na foto, de Paulo Leal) reinterpretam Fernando Tordo, Paulo Praça homenageia os GNR, Tiago Guillul e Margarida Pinto os Heróis do Mar, os Cindy Kat vão aos Sétima Legião e Os Pontos Negros atiram-se a... Armando Gama. A música portuguesa está a virar-se para o seu interior, redescobrindo-o e reinventando-o. E isso é um bom sinal.




A música portuguesa será exportável?
Publicado em 21 de Janeiro de 2010

O último número da revista "Ticketline" incluía uma reportagem com os Moonspell em digressão pelo Leste da Europa. E dava conta de como esta banda de metal portuguesa é acarinhada e respeitada por lá. Como em muitos outros países. Mas é um caso raro de exportação de sucesso de música portuguesa (ou, se se preferir, de música feita por portugueses). No passado, são poucos os exemplos de nomes portugueses que conseguiram saltar as fronteiras do rectângulo: Amália (claro!), mas também Luís Piçarra - que actuou em todo o mundo e vendeu muitos milhares de discos no estrangeiro (diz-se que um milhão de exemplares, só da sua versão de "Coimbra" em francês, "Avril au Portugal") -, o Duo Ouro Negro e os Madredeus. Mais recentemente, Dulce Pontes, Mísia e Mariza (e outros fadistas, incluindo desvios como os Deolinda) levaram o fado a todo o lado. No estrangeiro, aliás, o fado ainda é sinónimo de toda a música tradicional portuguesa, não havendo casos de sucesso (à excepção dos Dazkarieh, que juntam à tradição uma boa dose de distorção rock) de artistas ou grupos de música tradicional de inspiração rural. Noutros pequenos nichos de mercado - Fonzie, Rafael Toral, Les Baton Rouge, Blasted Mechanism, Parkinsons, Wray Gunn (na foto) e poucos mais -, os portugueses são igualmente bem aceites. Mas a pop/rock mainstream nunca o conseguiu. Segunda pergunta (subsidiária da do título): para quando a criação de uma estrutura oficial de apoio à promoção, divulgação e exportação da nossa música?

(*) - Infelizmente, mais de um ano depois da publicação deste texto, o álbum dos Gaiteiros de Lisboa continua sem ser editado. Quando o será?

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